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Assalto

Agora estou em choque. Paralisada. A minha volta uns quinze policiais, todos equipados com seu material de trabalho. Pesado.

 Era por volta de umas 4h30 da tarde, eu estava só na sala. Concentrada numa tarefa que tinha reservado para aquele horário. Ouço alguém entrando e é meu gerente, sem olhar para ele escuto-o falando para eu ficar calma; acho estranho e imagino que logo após a dita frase, viria mais uma das suas brincadeiras. Engano. Olho para sua direção e não o vejo sozinho, há uma arma colada na sua cabeça. E eu consigo ver o lado de dentro do cano. Gelei. Dali em diante eu emudeci. Baixei a cabeça e parecia que todas as emoções tinham se perdido dentro de mim, só me restava o medo. Ouvia um homem  falar, pedia que entregássemos o dinheiro, coisa que não havia ali. Eu respondia, mas em pensamento. Meu gerente parecia dominar a situação, conversava com ele e pedia tempo. E tempo era o que eu já não tinha. Como que feito estátua, passava um filme na minha cabeça. Eu sabia que morreria ali, tinha pouco tempo para fazer um exame de consciência e clamar pela misericórdia. Nos meus pensamentos vieram os anos que até ali eu tinha vivido. Se é que tinha vivido durantes esses anos. O que eu tinha feito de bom durante toda minha vida? Os projetos que ainda estavam no rascunho da minha memória? A viagem que eu tinha programado com o amor que eu havia de encontrar? E os chás de panela que minhas amigas ainda dariam? Ah, e aquele sorriso dos meus pais em ver seus primeiros netos?  Ainda tinha aquela realização profissional que eu, pouco a pouco, começava a almejar.

Nesse curto espaço de tempo, eu vi toda a historia que eu ainda não vivi se passar por mim. Não chorei. O medo havia congelado todas as minhas emoções, lembra?! Parecia o fim, o fim de coisas que nem havia começado, de sonhos que eu nem anotei. Parecia o fim de um amor que estava guardado em mim e nem deu tempo transbordar. De cabeça baixa, eu apenas rezava. Deu medo de perder o Céu. Como estava minha alma até ali, não sei.

Algo aconteceu que os policiais chegaram. Ele se rendeu. Deitou-se no chão. Foi pego. No revólver, duas balas. Talvez tivessem sido certeiras. Talvez. Não morri. Mas o medo da morte em si não é o peso maior. O que dói é ver morrer seus sonhos, seus projetos, sua história, sua alma. Dali eu tive a impressão de não estar vivendo, viver  vai além do pensar, é agir. A vida é movimento, é atitude diante de si mesmo. É, eu tive que quase morrer para saber o que é viver de verdade. Não é clichê, realmente eu só tenho a certeza do agora. Tenho medo de não ter o amanhã para fazer o que há em meu peito hoje.


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