Eu me lembro bem desse dia, mal tinha dormido para que chegasse logo. Era uma quinta feira de uma semana comum. Se não me engano, tinha por volta dos meus 7 anos de idade. Acordei cedinho, meu pai já estava de pé e certamente havia organizado o que iria levar. Era a primeira vez que eu iria viajar, pelo menos que me vem à memória. Iríamos nós dois.
Hora do banho e de lavar os cabelos também. E é esta a lembrança: debaixo do chuveiro com aqueles cabelos volumosos , longos e cacheados. Meu pai com o shampoo nas mãos. Sentado num banco improvisado, começava a lavar. Eu não tinha muito que fazer sob aquelas águas, eu apenas me vislumbrava com a viagem, ansiedade de criança. Com cuidado ele desembaraçava cada mecha, ele sempre gostou dos cachos que formavam; ahh se eu tivesse o escutado! Não era comum ele fazer isso, mas a ocasião pedia e ele sabia que todo aquele cabelo me custava cuidar.
Agora com a cabeça leve, cabelos lavados. Não parou por aí; ainda tinha que finalizar e deixar os cachos perfeitos, não sei ao certo se funcionou, era tanto cabelo que dava para me esconder entre eles.
Fomos. Dentro do ônibus não tinha muita graça, tratei logo de cochilar e nada vi fora daquela janela, nem mesmo as árvores correndo feito loucas. Passou, chegamos e daí já não me lembro mais.
Hoje me bateu essa lembrança. Uma saudade talvez doída, de um tempo que não volta mais. Hoje me bateu a saudade de ser de novo cuidada, de poder entregar meus cabelos e sentir a leveza de um cuidado sem pretensão. Saudade dos meus cachos, dos cabelos dourados, que mais eram de sol queimado. Bateu uma vontade de, como debaixo das águas, deixar ser lavada, alma, corpo, coração. Ah, que saudade isso me trouxe de, mesmo sem saber o destino, deixar-me ir numa viagem qualquer, e estando cansada da paisagem poder dormir sem alguma preocupação. Hoje me bateu essa vontade, essa saudade de ser cuidada assim.
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